quarta-feira, julho 4

* A justa homenagem depois de Garota de Ipanema...


Então..., o máximo da citação que as mulheres de São Paulo ouviram antes era: .... da deselegância discreta de suas meninas....,  na inspiradíssima e belíssima "Sampa" de Caetano....


 


Daí, até se releva a ofensa... rss

                                           
Pois é, vadiando hoje pela internet encontro um texto de Marcelo Rubens Paiva, um paulistano (suspeeeeitooooo!) bem humorado, que fala de  mulheres, que podiam ser de qualquer canto do mundo, inclusive e particularmente de São Paulo.
Vamos a ele... rss

A Garota de São Paulo 

Existem mais de cem tons de cores. Mas prefere o preto.
Cítricas? Só quando vai à praia.
E costuma cobrir suas pernas esticadas, finas, com meias pretas.
Usa botas. Não existe mulher que se veste melhor do que as paulistas. E que saiba qual bota escolher e como andar sobre elas.
Sabe o equilíbrio entre o moderno e o convencional. Senso estético apurado. Dona do seu próprio estilo.
A paulista não anda, caminha apressada. Vem e passa. Sem balanço. Sem mar para ir atrás. Moça do corpo pálido. Saturado pela pressa. Beleza que passa sozinha.
Não faz questão de chamar atenção.
Nem tanta questão de ser gostosa, mas magra.
Sempre de dieta.
Sempre em guerra contra a balança.
Malha para se afunilar. Intensamente, pois sabe que a gastronomia da cidade é uma tentação. Massas, pizzas, doces, sorvetes, doces, nhá benta, tesão…
Academia? Prefere pilates, que estica até o limite das juntas, quase rasga em duas.
E corre, se quer emagrecer urgentemente.
Olhando o chão, pois já tomou muitos tombos por causa das calçadas irregulares da cidade, uma anarquia de desníveis, pedras, buracos, pisos sem um padrão seguro para o seu caminhar apressado de botas, meias e pernas finas.
Rebolar? Fora de questão.
Olha para o chão e se lembra do que esqueceu, do quanto falta, do que faz falta, do que está errado.
A garota de São Paulo é perfeccionista, gosta de estar ajustada, como as engrenagens de uma indústria. Quer a precisão da esteira de uma linha de montagem.
Passa e olha para o chão, pois pensa nas atividades, nos prazos atrasados, nos compromissos da semana, na agenda do mês.
A garota de São Paulo leva uma vida saudável. Procura comer verduras sem agrotóxico.
Leite? Desnatado.
Carne vermelha? Eventualmente.
Carboidrato à noite? Nem pensar.
O pão tem que ser integral. Linhaça e aveia no café da manhã? Obrigação. Café descafeinado. Chás. Queijos brancos, magros.
Nada industrializado, a não ser a caixa de Bis, que detona algumas vezes em certos períodos, que por vezes tem o intervalo longo, mas quando se torna um vício, chora, porque algo deu errado, desembrulha e engole cada Bis, como se nele a explicação das incoerências.
Recicla o lixo.
Toma remédios para dormir. Toma excitantes para acordar. E aguentar a jornada.
Ela é ambiciosa, trabalha demais, em mais de um emprego, pensa em dez coisas ao mesmo tempo, procura conciliar a organização do lar com a de fora dele.
Ama e odeia o chefe.
Ama e odeia o trabalho.
Sabe que ele dá a independência para ser a moça que quiser, mas também tira o tempo de ser a moça que queria ser.
Metade dela sofre o descarte para a outra parte florescer.
Adora elogios.
Odeia galanteios.
Adora presentes.
Detesta insistentes.
Quer ser cortejada.
Jamais abusada.
Sorri quando assopram um elogio. Fecha a cara quando ultrapassam o limite da sua intimidade. Preserva a privacidade.
Algumas querem ser chefe. Chefiar garotos de São Paulo. O que só dispara seu conflito maior, o de agregar. Terá que dar ordens, broncas, demitir, exigir, estipular metas, cobrar eficiência. E depois sozinha em casa chora no escuro ao som de Billie Holiday. Se sente pressionada, e ela não sabe por quê. A vida não faz sentido, e ela não sabe por quê.
Chora em comerciais da TV, cerimônias de casamento, em maternidades, quando visita as amigas, no farol, quando uma criança vende bala.
A garota de São Paulo dirige bem. O problema é que se maquia enquanto fala no celular e ultrapassa um busão articulado, aproveitando a brecha entre ele e uma betoneira lotada de concreto. E se esconde no anonimato do insufilm, muda a música do MP3 e, dependendo dela, canta sozinha em voz alta, para não ouvir impropérios.
Faz tanta coisa ao mesmo tempo…
Dirige bem, mas é dispersa. Pensa em vinte coisas em dez segundos. Nunca chega a uma conclusão.
Liga para a mãe semanalmente. Troca poucas palavras com o pai. Detesta a esposa do irmão. E ama as amigas. Com quem viaja para a praia, para não ficarem um segundo em silêncio. Se o tempo não dá chances, prefere uma tarde na piscina do condomínio com as amigas do que encarar o parque lotado.
Se irrita com homens que falam de dinheiro. Se irrita com homens que contam vantagens no trabalho. Se irrita com homens grudentos, esnobes, arrumadinhos, fúteis, incultos, mal educados.
Gosta de homem interessante.
É assim que ela seleciona: os interessantes e os não.
O que é um homem interessante? Nem se gravar o papo de seis horas na piscina com as amigas consegue-se descobrir.
Tem que ser aquele que chega e não dá bola. Mas que a repara bem antes de ir embora. Que olha como se ela fosse a mais fosforescente das mulheres. E que desse um jeito a todo custo de trocar meia dúzia de palavras e, claro, criar laços e conexões.
Mas se nada der certo, garotos, não esquentem a cabeça. A mulher de São Paulo sabe seduzir. Sabe olhar e demonstrar. Sabe chamar atenção e indicar que você foi o escolhido. Sabe sorrir, ser paciente com a sua demora, ouvir atentamente os seus devaneios e engasgos. E, quando parece tudo estar perdido, sabe dizer a hora de ir embora, como e sugerir na casa de quem.
A garota de São Paulo não enrola.
Quando não quer, deixa claro.
Quando quer, faz de tudo para acontecer.
E não tem o menor pudor de ir para a casa com você na primeira noite, preparar o café da manhã da primeira manhã, que logo, logo, ambos saberão se vai se repetir ou ser o único.
Pode deixar. Andando de volta para casa, com suas meias pretas e botas, olhando para o chão, ela pensará em você.
Tudo isso é uma generalização literária. Mas me dá licença, poeta, para uma licença poética, homenageando sem pedir licença a graça pragmática da mulher paulista.

Marcelo  Rubens Paiva -  Nascido em São Paulo em 1959, mudou-se para a cidade do Rio de Janeiro em 1966, depois que seu pai, o ex-deputado federal socialista Rubens Paiva, foi cassado e exilado pelo Golpe de Estado no Brasil em 1964.
Em 1970, aos onze anos de idade, Marcelo sofreu o primeiro grande trauma de sua vida: o "desaparecimento"' do pai, que, depois de preso, foi torturado e morto na cidade do Rio de Janeiro.
Voltou a morar em São Paulo em 1974. Estudou no tradicional Colégio Santa Cruz. Depois, estudou engenharia agrícola na Universidade Estadual de Campinas. E então, aos vinte anos de idade, sofreu o segundo grande trauma: após saltar em um lago, fraturou uma vértebra (a quinta cervical) do pescoço ao chocar a cabeça em uma pedra, ficando tetraplégico. Após tratamento de fisioterapia, voltou a locomover as mãos e os braços, relatando os fatos em seu primeiro livro, Feliz Ano Velho. Publicado em 1982, foi traduzido para muitos idiomas e se converteu no livro nacional mais vendido da década de 1980, contando com mais de quarenta edições. O livro virou peça dirigida por Paulo Betti e também filme, dirigido por Roberto Gervitz. Ganhou os prêmios Jabuti e Moinho Santista.
Formou-se em comunicação pela Universidade de São Paulo e em teoria literária pela Universidade Estadual de Campinas.
Em 1986, lançou seu segundo romance: "Blecaute".
Desde 1989, depois que estudou dramaturgia no Centro de Pesquisa Teatral do Serviço Social do Comércio, na cidade de São Paulo, passou a escrever para teatro. Estreou com a peça 525 Linhas, dirigida por Ricardo Karman.
Em 1990, lançou o romance "Ua:brari". Em 1992, lançou "As Fêmeas", um ensaio sobre sexualidade.
No começo da década de 1990, apresentou o "Fanzine", um programa de entrevistas na TV Cultura. Em 1996, lançou o romance "Não És Tu, Brasil", baseado no episódio histórico da Guerrilha do Vale do Ribeira.
Em 1994, lançou o romance "Bala na Agulha".
Em 1998, montou E aí, Comeu?, peça dirigida por Rafael Ponzi, que, depois, mudou de nome pra Da Boca pra fora. Com ela, ganhou o Prêmio Shell de melhor autor em 2000.
Os livros Feliz Ano Velho e Blecaute foram publicados inicialmente pela Editora Brasiliense. Atualmente, Marcelo é contratado da Editora Objetiva.
Rafael Ponzi ainda dirigiu suas peças Mais-que-Imperfeito (2001) e Closet Show (2003). Marcelo Paiva adaptou o livro As Mentiras que Os Homens Contam para o teatro. Em 2003, estreou a peça No Retrovisor, com Marcelo Serrado e Otávio Müller, dirigida por Mauro Mendonça Filho. Em 2003, lançou o romance "Malu de Bicicleta", que Flávio Tambellini transformou em filme em 2010. Em 2006, fez a peça Amo-te, dirigida por Mauro Mendonça. No mesmo ano, lançou o livro de contos "O Homem que Conhecia as Mulheres". Em 2008, lançou o romance "A Segunda Vez que Te Conheci".
A partir de 2009, passou a dirigir suas próprias peças. A primeira experiência foi com A Noite Mais Fria do Ano, com Hugo Possolo, Paula Cohen, Alex Gruli e seu amigo e também dramaturgo Mário Bortolotto. Em 2010, dirigiu O Predador Entra na Sala, com Raul Barreto, Anna Cecília Junqueira e Celso Melez e o texto teatral da autora Priscila Nicolielo, Lá Fora, Algum Pássaro Dá Bom Dia.
Participou de projetos teatrais como a Mostra de Teatro do Serviço Social da Indústria com a peça Os Marcianos, do Festival de Um Minuto no Espaço Parlapatões, Teatrokê, Terça Insana. Escreveu também para a Rede Globo episódios com Pedro Cardoso para o Fantástico e, com João Falcão, para a série Guerra dos Sexos.
Trabalhou também muitos anos na imprensa escrita. Começou na revista Veja, em que foi crítico literário, passou pela Vogue, Folha de São Paulo, como colunista, articulista e repórter e, desde 2004, é colunista aos sábados do Caderno 2 do jornal O Estado de São Paulo, onde também mantém o blogue premiado pelo TopBlog de 2009 como "Melhor Blogue de Comunicação".


Nesse dia, além da Independência dos Estados Unidos, é feriado aqui em casa, aniversário da matriarca, uma garota de São Paulo: Parabéns, feliz aniversário! Tim tim!
Saúde, mamãe!

2 comentários:

Agradeço a sua visita e participação.