quarta-feira, dezembro 2

* Sonhar é preciso! Arregaçar as mangas também!



Nasce filha de Mark Zuckerberg, CEO do Facebook

 
O bebê do CEO do Facebook com a médica Priscila Chan veio ao mundo nesta terça-feira (1) e o pai escreveu uma carta para a pequena. Ele anunciou que vai doar 99% das ações da empresa para projeto de "tornar o mundo melhor"
 

Mark Zuckerberg anunciou, no início da noite desta terça-feira (1), o nascimento de sua primeira filha,  Max. A notícia, é claro, foi revelada para os seguidores do pai no Facebook. "Priscilla e eu estamos tão felizes por poder dar as boas-vindas à nossa filha, Max, ao mundo!", escreveu. "Para o nascimento, escrevemos uma carta para ela sobre o mundo no qual esperamos que ela cresça", continuou. "É um mundo onde nossa geração pode avançar no potencial humano e promover igualdade - para curar doenças, personalizar o aprendizado, usando energia conectando as pessoas, construindo comunidades fortes, reduzindo a pobreza, providenciando direitos iguais e espalhando a compreensão entre as nações".

 Ele ainda anunciou: "Vamos doar 99% das ações do Facebook, atualmente no valor de US$ 45 bilhões - durante as nossas vidas para nos juntar a muitos outros na missão de melhorar este mundo para a próxima geração". 

 "Obrigada a todos vocês nessa comunidade por todo o amor e apoio durante a gestação. Vocês têm nos dado esperança de que, juntos, podemos construir esse mundo para Max e para todas as crianças", completou. 

Veja a tradução na íntegra: 

"Querida Max, 

Sua mãe e eu ainda não temos palavras para descrever a esperança que você nos dá para o futuro. Sua nova vida será cheia de promessas, e nós esperamos que você seja feliz e saudável para poder aproveitá-la inteiramente. Você já nos deu uma razão para pensar no mundo no qual esperamos que você viva.
Como todos os pais, nós queremos que você cresça em uma mundo melhor que o nosso hoje.
 Enquanto as manchetes com frequência focam em tudo o que está errado, de muitas maneiras o mundo tem se tornado um ligar melhor. A saúde está melhorando. A pobreza está diminuindo. O conhecimento está crescendo. Pessoas estão se conectando. O progresso tecnológico em todos os campos significa que a sua vida será drasticamente melhor do que a nossa hoje.
Nós faremos a nossa parte para que isso aconteça, não apenas porque nós amamos você, mas também porque temos responsabilidade moral com todas as crianças da próxima geração.
 Nós acreditamos que todas as vidas têm o mesmo valor, e isso inclui o fato de que muitas pessoas mais vão viver nas futuras gerações do que vivem hoje. Nossa sociedade tem obrigação de investir agora para melhorar as vidas de todos os que chegarão a este mundo, não apenas dos que já estão aqui.
Mas agora, nós não sempre direcionamos coletivamente nossos recursos para as maiores oportunidades e problemas que a sua geração vai enfrentar.
Considere a doença. Hoje nós gastamos mais de 50 vezes mais como uma sociedade que trata as pessoas que estão doentes do que investimos em pesquisa para prevenir que as pessoas fiquem doentes em primeiro lugar.
A medicina só é uma ciência real há menos de 100 anos, e nós já vimos curas completas para muitas doenças e bom progresso para outras. Conforme a tecnologia avança, temos uma grande chance na prevenção, na cura e no gerenciamento da grande maioria (das doenças) para os próximos 100 anos.
Hoje, a maioria das pessoas morre de cinco coisas – doenças cardíacas, câncer, derrame, doenças neuro degenerativas e infecciosas – e nós podemos fazer um progresso mais rápido para esses e outros problemas.
Uma vez que nós reconheçamos que nossa geração e a geração dos nossos filhos talvez não tenha que sofrer com doenças, temos coletivamente a responsabilidade de direcionar nosso investimentos um pouco mais na direção de fazer com que isto se torne uma realidade. Sua mãe e eu queremos fazer a nossa parte.
Curar doenças leva tempo. Durante curtos períodos de 5 ou 10 anos, pode parecer que não estamos fazendo muita diferença. Mas em longo prazo, as sementes plantadas agora vão crescer, e um dia, você e seus filhos vão ver aquilo que por enquanto só podemos imaginar: um mundo que não sofre com doenças.
Há tantas oportunidades como esta. Se a sociedade focar mais de sua energia nesses grandes desafios, deixaremos nossa geração com um mundo melhor. 
***
Nossas esperanças para a sua geração são focadas em duas ideias: avançar o potencial humano e promover igualdade.
Avançar o potencial humano é sobre forçar nossos limites para o quão grande a vida humana pode ser.
Você pode aprender e experimentar 100 vezes mais do que fazemos hoje?
 Nossa geração pode curar doenças para que você viva por mais tempo e com mais saúde?
Podemos conectar o mundo para que você tenha acesso a cada ideia, pessoa e oportunidade?
Podemos usar mais energia limpa para que possamos inventar coisas que não podemos imaginar hoje, enquanto protegemos o meio-ambiente?
Podemos cultivar o empreendedorismo para que possamos construir qualquer negócio e resolver qualquer desafio para cultivar a paz e a prosperidade?
Promover igualdade é sobre ter certeza de que todo tenha acesso a todas essas oportunidades - independente da nação, das famílias e das circunstâncias em que as pessoas nasceram.
Nossa sociedade deve fazer isso não apenas por justiça ou caridade, mas pela grandeza do progresso humano.
Hoje somos privados do potencial que tantos têm a oferecer. O único jeito de alcançar nosso potencial por completo é sintonizar os talentos, ideias e contribuições de cada pessoa no mundo.
Nossa geração pode eliminar a pobreza e a fome?
Podemos prover a fotos com cuidados básicos com a saúde?
Podemos construir comunidades inclusivas e acolhedoras?
Podemos nutrir relações pacíficas e compreensivas entre as pessoas de todas as nações?
Podemos de verdade empoderar a todos - mulheres, crianças, minorias sem representação, imigrantes e os desconectados?
Se a nossa geração fizer os investimentos certos, a resposta para cada uma dessas perguntas pode ser "sim" - e tomara que isso aconteça dentro do seu tempo de vida.
***
Essa missão - avançar no potencial humano e promover igualdade - vai exigir uma nova aproximação para todos que trabalham em prol dessas metas.
Devemos fazer investimentos a longo prazo, para mais de 25, 50 ou até 100 anos. Os maiores desafios requerem horizontes de um tempo muito longo e não podem ser resolvidos se pensarmos a curto prazo.
Devemos nos engajar diretamente com as pessoas a que servimos. Não podemos empoderar as pessoas, se não entendermos diretamente as necessidades e os desejos de suas comunidades.
Nós devemos construir tecnologia para fazer mudanças. Muitas instituições investem dinheiro nesses desafios, mas a maior parte do progresso vem dos ganhos de produtividade por meio da inovação.
Devemos participar da política e da advocacia para dar forma aos debates. Muitas instituições não querem fazer isso, mas o progresso deve ser apoiado por movimentos para ser sustentável.
Devemos apoiar os mais fortes e independentes líderes em cada campo. Formar parcerias com especialistas é mais efetivo para a missão do que tentar liderar os esforços por nós mesmos.
Devemos nos arriscar hoje para aprender lições amanhã. Estamos adiantados no nosso aprendizado e muitas coisas que tentamos não vão funcionar, mas nós escutaremos e aprenderemos e continuaremos melhorando.
***
Nossa experiência com o aprendizado personalizado, o acesso à internet e a educação e saúde comunitárias deu forma à nossa filosofia.
Nossa geração cresceu em salas de aula onde todos nós aprendíamos as mesmas coisas no mesmo ritmo independente de nossos interesses e necessidades.
Sua geração vai estabelecer objetivos para o que você quiser se tornar – como um engenheiro, um trabalhador da saúde, um professor ou um líder comunitário. Você terá tecnologias que entenderão como você aprende melhor e onde você precisa focar. Você avançará rápido nas matérias que lhe interessarem mais, e receberá ajuda naquelas que forem mais desafiadoras. Você explorará tópicos que nem são oferecidos nas escolas hoje. Seus professores também terão ferramentas melhores e dados para ajudá-lo a alcançar seus objetivos.
Ainda melhor, estudantes ao redor do mundo poderão usar ferramentas de aprendizagem personalizadas pela internet, ainda que eles não vivam perto de boas escolas. É claro que será preciso mais do que tecnologia para dar a cada pessoa um começo da vida justo, mas o ensino personalizado será uma maneira acessível de dar a todas as crianças uma melhor educação e mais igualdade de oportunidades.
Estamos começando a construir essa Tecnologia agora, e os resultados já são promissores. Os alunos não apenas têm um desempenho melhor nas provas, mas também ganham habilidades e confiança para aprender tudo o que quiserem. E essa jornada é só o começo. A Tecnologia e o ensino vão melhorar rapidamente a cada ano que você estiver na escola.
Sua mãe e eu ensinamos alguns estudantes e vimos o que é preciso para fazer isso funcionar.
Será preciso trabalhar com os líderes mais fortes da educação para ajudar as escolas ao redor do mundo a adotarem o ensino personalizado. Será preciso do engajamento com as comunidades, por isso é que estamos começando na nossa comunidade de San Francisco Bay Area. Será preciso construir novas tecnologias e tentar ideias novas. E será preciso cometer erros e aprender muitas lições antes de alcançar esses resultados.
Mas uma vez que a gente entenda o mundo que podemos criar para a sua geração, temos a responsabilidade como sociedade em focar nossos investimentos no future para que isso se torne realidade.
Juntos, nós podemos fazer isso. E quando nós fizermos, o ensino personalizado não vai só ajudar alunos de boas escolas, mas vai ajudar a proporcionar mais igualdade de oportunidade para qualquer pessoa que tenha acesso à internet.
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Muitas das melhores oportunidades para a sua geração virão ao oferecer a todos acesso à internet.
As pessoas sempre pensam na internet como algo a ser usado apenas para entretenimento ou para a comunicação. No entanto, para a maioria das pessoas no mundo, a internet pode ser um salva-vidas.
Ela oferece educação se você não mora perto de uma boa escola. Ela oferece informação de saúde sobre como evitar doenças ou criar crianças saudáveis se você não mora perto de um médico. Ela oferece serviços financeiros se você não mora perto de um banco. Ela oferece acesso aos nossos trabalhos e oportunidades se você não vive em uma boa economia.
A internet é tão importante que, para cada dez pessoas que ganham acesso a internet, uma emerge da pobreza e um novo emprego é criado.
Ainda assim, mais da metade da população mundial - mais de 4 bilhões de pessoas - não têm acesso à internet.
Se a nossa geração os conectar, podemos tirar centenas de milhões de pessoas da pobreza. Também podemos ajudar centenas de milhões de crianças a conseguirem uma educação e salvar milhões de vidas ajudando as pessoas a evitarem doenças.
Este é outro esforço a longo prazo que pode ser avançado com a tecnologia e com as parcerias. Vamos precisar inventar novas tecnologias para tornar a internet mais acessível e trazer acesso a áreas desconectadas. Isso vai requerer parcerias com os governos, com organizações sem fins lucrativos e com empresas. Isso vai requerer o engajamento com as comunidades para entender o que eles precisam. Boas pessoas terão visões diferentes sobre o melhor caminho para avançar e nós tentaremos muitas coisas antes de obtermos o sucesso.
Mas juntos nós podemos ter sucesso e criar um mundo mais igualitário.
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A tecnologia não pode resolver problemas sozinha. Construir um mundo melhor começa com a construção de comunidades fortes e saudáveis.
As crianças têm melhores oportunidades quando elas podem aprender. E elas aprendem melhor quando elas têm saúde.
A saúde começa cedo - com uma família amorosa, boa nutrição e um ambiente seguro e estável.
As crianças que encaram experiências traumáticas no começo da vida muitas vezes desenvolvem mentes e corpos menos saudáveis. Estudos mostram as mudanças físicas no desenvolvimento do cérebro, que levam a uma menor habilidade cognitiva.
Sua mãe é uma médica e educadora, e ela tem visto isso em primeira mão.
Se você tem uma infância que não é saudável, é difícil alcançar todo o seu potencial.
Se você precisa se perguntar se você vai ou não ter comida ou dinheiro para o aluguel, ou se preocupar com abusos ou crimes, então, é difícil alcançar todo o seu potencial.
Se você teme ir para a prisão em vez de ir para a faculdade por causa da cor da sua pele ou teme que sua família seja deportada por conta de seu status legal, ou teme ser vítima de violência por causa da sua religião, orientação sexual ou identidade de gênero, então, é difícil alcançar todo o seu potencial.
Precisamos de instituições que entendem que estas questões estão todas conectadas. Essa é a filosofia do novo tipo de escola que sua mãe está construindo.
Por meio de parcerias com escolas, centros de saúde, grupos de pais e governos locais, e nos assegurando de que todas as crianças estão bem alimentadas e cuidadas para entrar na juventude, nós podemos começar a tratar essas desigualdades conectadas. Só aí podemos começar coletivamente a dar a todos uma oportunidade igual.
Levará muitos anos para desenvolvermos esse modelo por completo. Mas é um outro exemplo de como avançar o potencial humano e promover igualdade estão fortemente interligados. Se quisermos isso, devemos primeiro construir comunidades inclusivas e saudáveis.
***
Para que a sua geração viva em um mundo melhor, há muito mais que nossa geração pode fazer.
 Hoje sua mãe e eu nos comprometemos a gastar nossas vidas fazendo nossa pequena parte para ajudar a solucionar esses desafios. Eu continuarei sendo CEO do Facebook por muitos, muitos anos à frente, mas esses assuntos são importantes demais para esperar até que você ou eu sejamos velhos para começar esse trabalho. Começando em uma idade jovem, esperamos ver muitos benefícios durante toda a nossa vida.
Enquanto você dá à próxima geração da família Chan Zuckerberg, nós também damos inicio à Iniciativa Chan Zuckerberg para unir pessoas ao redor do mundo para avançar no potencial humano e promover a igualdade para todas as crianças da próxima geração. Nossas áreas iniciais focam em ensino personalizado, cura de doenças, conexão de pessoas e construção de comunidades fortes.
Todos daremos 99% de nossas ações do Facebook – atualmente 45 bilhões de dólares – durante nossas vidas para avançar nessa missão. Sabemos que é uma pequena contribuição comparando com todos os recursos e talentos daqueles que já estão trabalhando nisso. Mas nós queremos fazer tudo o que pudermos, trabalhando ao lado de muitos outros.
Compartilharemos mais detalhes durante os próximos meses, uma vez que tenhamos estabelecido nosso novo ritmo familiar e retornado de nossas licenças maternidade e paternidade. Entendemos que todos terão muitas perguntas sobre como estamos fazendo isso.
Conforme nos tornamos pais e entramos nesse novo capítulo de nossas vidas, queremos dividir nosso profundo apreço por todos que tornaram isso possível.
Apenas podemos fazer esse trabalho porque temos uma forte comunidade global atrás de nós. Construir o Facebook criou recursos para melhorar o mundo para a próxima geração.  Cada membro da comunidade do Facebook é uma peça deste trabalho.
Podemos fazer progressos em direção a essas oportunidades apenas se nos apoiarmos nos especialistas – nossos mentores, parceiros e muitas pessoas incríveis que cujas contribuições construíram esses campos.
E só podemos focar em servir essa comunidade e essa missão porque estamos cercados por uma família amorosa, amigos apoiadores e colegas incríveis. Esperamos que você também tenha relações profundas e inspiradoras como essas em sua vida.
Max, nós te amamos e sentimos uma grande responsabilidade em em deixar um mundo melhor para você e seus filhos. Desejamos que a sua vida seja cheia do mesmo amor, esperança e alegria que você nos dá. Mal podemos esperar para ver o que você trouxe para este mundo. 

Com amor,

 Papai e mamãe"

sábado, novembro 14

* A primeira geladeira....

Olá,
Nem sei se estou voltando, mas,  hoje me deu uma vontade irresistível de mostrar um texto publicado pela BBC.
Com saudade e carinho mando um copy&cola pra galera...

Beijos meus....




Tim Vickery: Minha primeira geladeira e por que o Brasil de hoje lembra a Inglaterra dos anos 60

Tim Vickery* Colunista da BBC Brasil - 13 novembro 2015



Acho que nasci com alguma parte virada para a lua. Chegar ao mundo na Inglaterra em 1965 foi um golpe e tanto de sorte. Que momento! The Rolling Stones cantavam I Can’t Get no Satisfaction, mas a minha trilha sonora estava mais para uma música do The Who, Anyway, Anyhow, Anywhere.

Na minha infância, nossa família nunca teve carro ou telefone, e lembro a vida sem geladeira, televisão ou máquina de lavar. Mas eram apenas limitações, e não o medo e a pobreza que marcaram o início da vida dos meus pais.

Tive saúde e escolas dignas e de graça, um bairro novo e verde nos arredores de Londres, um apartamento com aluguel a preço popular – tudo fornecido pelo Estado. E tive oportunidades inéditas. Fui o primeiro da minha família a fazer faculdade, uma possibilidade além dos horizontes de gerações anteriores. E não era de graça. Melhor ainda, o Estado me bancava.

Olhando para trás, fica fácil identificar esse período como uma época de ouro. O curioso é que, quando lemos os jornais dessa época, a impressão é outra. Crise aqui, crise lá, turbulência econômica, política e de relações exteriores. Talvez isso revele um pouco a natureza do jornalismo, sempre procurando mazelas. É preciso dar um passo para trás das manchetes para ganhar perspectiva.


Será que, em parte, isso também se aplica ao Brasil de 2015?


Não tenho dúvidas de que o país é hoje melhor do que quando cheguei aqui, 21 anos atrás. A estabilidade relativa da moeda, o acesso ao crédito, a ampliação das oportunidades e as manchetes de crise – tudo me faz lembrar um pouco da Inglaterra da minha infância.

Por lá, a arquitetura das novas oportunidades foi construída pelo governo do Partido Trabalhista nos anos depois da Segunda Guerra (1945-55). E o Partido Conservador governou nos primeiros anos da expansão do consumo popular (1955-64). Eles contavam com um primeiro-ministro hábil e carismático, Harold Macmillan, que, em 1957, inventou a frase emblemática da época: "nunca foi tão bom para você" ("you’ve never had it so good", em inglês).


É a versão britânica do "nunca antes na história desse país". Impressionante, por sinal, como o discurso de Macmillan trazia quase as mesmas palavras, comemorando um "estado de prosperidade como nunca tivemos na história deste país" ("a state of prosperity such as we have never had in the history of this country", em inglês).

Macmillan, "Supermac" na mídia, era inteligente o suficiente para saber que uma ação gera uma reação. Sentia na pele que setores da classe média, base de apoio principal de seu partido, ficaram incomodados com a ascensão popular.

Em 1958, em meio a greves e negociações com os sindicatos, notou "a raiva da classe média" e temeu uma "luta de classes". Quatro anos mais tarde, com o seu partido indo mal nas pesquisas, ele interpretou o desempenho como resultado da "revolta da classe média e da classe média baixa", que se ressentiam da intensa melhora das condições de vida dos mais pobres ou da chamada "classe trabalhadora" ("working class", em inglês) na Inglaterra.

Em outras palavras, parte da crise política que ele enfrentava foi vista como um protesto contra o próprio progresso que o país tinha alcançado entre os mais pobres.


Mais uma vez, eu faço a pergunta – será que isso também se aplica ao Brasil de 2015?


Alguns anos atrás, encontrei um conterrâneo em uma pousada no litoral carioca. Ele, já senhor de idade, trabalhava como corretor da bolsa de valores. Me contou que saiu da Inglaterra no início da década de 70, revoltado porque a classe operária estava ganhando demais.

No Brasil semifeudal, achou o seu paraíso. Cortei a conversa, com vontade de vomitar. Como ele podia achar que suas atividades valessem mais do que as de trabalhadores em setores menos "nobres"? Me despedi do elemento com a mesquinha esperança de que um assalto pudesse mudar sua maneira de pensar a distribuição de renda.

Mais tarde, de cabeça fria, tentei entender. Ele crescera em uma ordem social que estava sendo ameaçada, e fugiu para um lugar onde as suas ultrapassadas certezas continuavam intactas.


Agora, não preciso nem fazer a pergunta. Posso fazer uma afirmação. Essa história se aplica perfeitamente ao Brasil de 2015. Tem muita gente por aqui com sentimentos parecidos. No fim das contas, estamos falando de uma sociedade com uma noção muito enraizada de hierarquia, onde, de uma maneira ainda leve e superficial, a ordem social está passando por transformações. Óbvio que isso vai gerar uma reação.

No cenário atual, sobram motivos para protestar. Um Estado ineficiente, um modelo econômico míope sofrendo desgaste, burocracia insana, corrupção generalizada, incentivada por um sistema político onde governabilidade se negocia.

A revolta contra tudo isso se sente na onda de protestos. Mas tem um outro fator muito mais nocivo que inegavelmente também faz parte dos protestos: uma reação contra o progresso popular. Há vozes estridentes incomodadas com o fato de que, agora, tem que dividir certos espaços (aeroportos, faculdades) com pessoas de origem mais humilde. Firme e forte é a mentalidade do: "de que adianta ir a Paris para cruzar com o meu porteiro?".

Harold Macmillan, décadas atrás, teve que administrar o mesmo sentimento elitista de seus seguidores. Mas, apesar das manchetes alarmistas da época, foi mais fácil para ele. Há mais riscos e volatilidade neste lado do Atlântico. Uma crise prolongada ameaça, inclusive, anular algumas das conquistas dos últimos anos. Consumo não é tudo, mas tem seu valor. Sei por experiência própria que a primeira geladeira a gente nunca esquece.

*Tim Vickery é colunista da BBC Brasil e formado em História e Política pela Universidade de WarwickTim Vickery: Minha primeira geladeira e por que o Brasil de hoje lembra a Inglaterra dos anos 60